Os descobridores de Carambeí

Por: Gilberto de Geus

Quando me refiro à descoberta de Carambeí, é claro que estou falando da chegada dos primeiros holandeses até esta região. E os primeiros, aliás, o primeiro holandês a conhecer essas terras foi o Sr. Jan Verschoor, pai da minha avó Cornelia mãe do meu pai Arie de Geus.

Temos que começar com a imigração da família Verschoor desde a Holanda até o Brasil. A família do Leendert Verschoor e do Jan Verschoor, como ocorreu com a maioria das famílias de imigrantes, apostou numa melhora de suas vidas, arriscando o seu futuro em terras brasileiras. A propaganda sobre a imigração para o Brasil soava como música nos ouvidos das pobres “vítimas”. Ambos trabalhavam no porto de Roterdam, onde observavam levas de famílias indo para o novo mundo. Resolveram vender o que tinham e embarcaram para o Brasil em 29/09/1909 à bordo do navio Frisia. Depois de 41 dias chegaram à Paranaguá, já haviam passado no Rio de Janeiro e em Santos. Enfim em solo paranaense, de trem viajaram para Curitiba pela belíssima via férrea, o que lhes deu uma boa impressão da nova pátria, montanhas, desfiladeiros, rios e uma vegetação deslumbrante. Depois de alguns dias novamente de trem viajaram rumo a Ponta Grossa – Campos Gerais, a mudança da vegetação foi logo percebida pelo Sr Leen, entre pequenos vales com bosques, muitos campos de capim ralo. E aí tem um relato curioso, quando ele passa com sua família pelos campos, diz : “ Estes campos me parecem ótimos para a criação de gado leiteiro”. Seria essa uma premunição? Ou só um palpite! Em Ponta Grossa, onde permanecem alguns dias, realizam uma compra básica de produtos recomendados pelos responsáveis da imigração. Pronto finalmente rumo a Irati. Leen percebe uma nova mudança na paisagem, os campos dão lugar a uma mata fechada com grandes arvores em formato de guarda-chuva (nossos pinheiros). Nesta viagem entram em contato com compatriotas que contam histórias muito tristes sobre os imigrantes já instalados. Isso desperta nas duas famílias um sentimento de medo.

Leendert Verschoor era casado com Wilhelmina Reugenbrink, tinham três filhas (Willemina, Cornelia e Neeltje) e um filho o Willem. Jan era casado com Rookje van Solingen então com 6 filhas (Niesje, Cornelia Arina – minha avó, Willemina Elizabeth, Maaike, Lena e Elizabeth) e um filho Cornelis Willem, o único filho homem que sobreviveria à saga da imigração. A família Jan Verschoor sofre a primeira perda, a filha mais nova falece antes do final do ano. Os Verschoor têm suporte para as grandes adversidades que enfrentavam pela fé incondicional em Cristo. Seu lema para os momentos que estavam passando e os que ainda teimavam em aparecer era “Que vantagem Senhor, que não divulgou o nosso futuro senão a vida seria insuportável”. Foram estas palavras bíblicas que mantiveram estas famílias em pé.

Os Verschoor chegaram tarde demais para começarem a preparar a terra para a safra. Não daria mais tempo para produzirem uma boa colheita e resolvem trabalhar fora, quer seja na construção de ferrovias ou então em estradas de terra batida. Muitos dos imigrantes tiveram que optar em trabalhar fora, às vezes longe de suas casas, o que exigia que saíssem na segunda feira de manhã e voltando somente nas sextas feiras. Época de vacas magras, fome e desespero, pois nem leite para os pequenos havia. Muita desnutrição com morte de crianças e de mulheres que ainda estavam de “dieta” (pós-gravidez). Leendert relata em seu diário que foi um período muito difícil, devido à fome, e com os maridos trabalhando longe, muitas mulheres foram forçadas a se prostituirem em troca de comida. Escreve que graças ao Grande Pai sua família não precisou passar por esta provação.

Outra grande tristeza para as famílias Verschoor foi a morte do único filho homem do Leendert, aos sete anos, provavelmente de tifo ou malária. Logo em seguida a esposa do Jan, a Rookje, tem um menino e devido a complicações pós parto morre; o pequeno ainda vive algum tempo e também morre. Depois da morte da Rookje o Leendert convida seu irmão a morarem juntos e assim tornar-se-iam mais fortes e teriam mais tempo para se dedicar ao plantio de suas roças.
Os Verschoor juntos possuíam dois lotes, separados por um morro e mata de araucárias. No ano de 1910 Leen e Jan preparam suas terras para a safra, tudo corria bem, até que a praga dos gafanhotos começou a atacar as plantações, como seus vizinhos os Verschoor munidos de latas, panelas e da própria voz, tentaram afugentar a praga de suas lavouras. Resultado – só sobraram talos. Como o ataque tinha sido na lavoura do Leen e este era o lote onde tinham sua casa, nem pensaram em salvar a roça que estava nas terras do Jan, do outro lado do morro. Desanimados com a grande perda de sua colheita, os dois resolvem ir até o lote do Jan. Qual a surpresa? A lavoura estava intacta, tudo muito bonito e cheio de folhas, flores e formando as sementes. Alegres voltam para sua casa e contam aos familiares que a roça do Jan escapou da praga. A colheita foi boa, só que a família agora era grande. Começam então a se preocupar com o futuro, como fazer até a próxima safra, o que colheram não daria para sustentar a todos. Leen resolve que ele irá para as frentes de trabalho a 20 km de distância e Jan continua trabalhando na terra.

Nesse período de trabalho fora o Leen encontra o Sr. Van den Berg, que conta para ele do surgimento de uma nova colônia, agora longe das matas, e sendo instalada em campos a uma distância de 4 horas de Ponta Grossa, a segunda maior cidade do Paraná. Também lá os colonos receberiam 25 hectares de terras além de uma ajuda para todos os gastos que poderiam ser pagos em prestações durante 10 anos. Retornando para sua casa Leen reúne sua família e relata o encontro com o Van den Berg. Decidem viajar até a nova terra mas, quando foram comprar as passagens, descobriram que o dinheiro que possuíam não era suficiente para os dois irem. Leen decide que seu irmão Jan vá sozinho. Jan descobre Carambehy – amor à primeira vista. Jan encantado com o que viu, volta para Gonçalves Junior, vendem tudo, se despedem dos amigos e chegam ao novo endereço em 29/03/1911.

Começa então uma nova história, mas as dificuldades sempre acompanham os recém chegados. Fé inabalável é que movia os pioneiros. Jan, o viúvo resolve viajar até a Holanda à procura de uma nova esposa. Na volta, sem esposa, trás consigo três pessoas: Oom Jacob Voorsluys, meu tio avô Arie de Geus e meu avô com apenas 17 anos, Leendert de Geus. Todos animados com as novas perspectivas de formar uma nova colônia em campos, longe das matas. A história agora se complica devido à má administração da Companhia Inglesa de Ferrovias (Railway Company). Dinheiro mal aplicado faz com que o projeto, de transformar Carambehy num pólo de produção de queijos, fracassasse. Jan volta mais uma vez para a Holanda na tentativa de achar uma esposa e trazer mais imigrantes para o projeto Carambehy. Durante a longa viagem de navio Jan adoece, chega muito fraco na Holanda e em seguida morre, deixando seus filhos no Brasil. Leen, junto com sua esposa resolvem adotar os filhos do Jan, transformando-a numa grande família. Em 1913 chega o restante da família de Geus.

Sr Aart Jan compra 3.500 hectares da Railway Company , que se retira do projeto. Agora as famílias de pioneiros deviam se virar por conta, e o começo foi cada um por si e Deus por todos.

Esta história está baseada no diário escrito por Leendert Verschoor e pelos relatos do meu pai. O diário está descrito no livro ‘Imigrantes’, dos autores Ruth & Willem Kiewiet